A Malabarista moderna: Quando uma mulher é todas as mulheres

Ela acorda cedo, antes da casa respirar. Prepara o café, ajeita o uniforme das crianças, responde aquele e-mail urgente no celular, lembra da reunião das 9h, do supermercado, da consulta médica do filho. Alguém ainda se lembra de perguntar como ela está?
Vivemos tempos em que o discurso da mulher “superpoderosa” ganhou glamour: a mulher que dá conta de tudo, que nunca erra, que sorri enquanto o mundo desaba sobre suas costas. Chamam isso de empoderamento. Eu chamo de armadilha.
A tal “tríplice jornada” — trabalho, casa, cuidado com a família — já virou clichê nas rodas de conversa. Mas o que ninguém diz é que por trás dessa jornada, há uma exaustão invisível, uma cobrança cruel travestida de admiração. Quantas vezes aplaudimos a mulher que se desdobra em mil sem perceber que, ao fazer isso, a empurramos para o abismo do burnout, da culpa constante e da sensação de insuficiência crônica?
A modernidade não libertou a mulher; ela sofisticou suas correntes. Agora, elas vêm em forma de agendas lotadas, produtividade tóxica e filtros de Instagram. É bonito ser multitarefa. É desejável ser impecável. Mas a que custo?
Não se trata de fragilidade, mas de lucidez. Ser multifacetada é sim uma potência, mas essa potência não deve ser confundida com obrigatoriedade. Somos muitas em uma só, mas não somos infinitas. A mulher não é um sistema operacional com 24 abas abertas. Ela é humana.
Por isso, é preciso falar sobre a importância de dividir responsabilidades em casa, no trabalho e na vida. E mais do que isso: é urgente quebrar o mito da “supermulher”. Ele não nos enaltece. Ele nos anula.
Reconhecer nossos limites é revolucionário. Dizer “não” é libertador. Lembrar que autocuidado não é luxo, mas sobrevivência, é um ato político.
Não queremos mais medalhas por suportar tudo caladas. Queremos a liberdade de ser inteiras, não heroínas exaustas. Afinal, a verdadeira força da mulher moderna está em saber que não precisa provar nada para ninguém. Apenas existir com dignidade já é, por si só, um ato de coragem.
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